Base de Melo aprova projeto que abre caminho para privatização do DMAE

Em uma sessão marcada pela resistência da oposição e pelos protestos da população, a Câmara de Vereadores de Porto Alegre aprovou, na madrugada desta quinta-feira (23), o projeto do governo Sebastião Melo (MDB) que autoriza a concessão parcial dos serviços do Departamento Municipal de Água e Esgotos (DMAE). 

Com 21 votos favoráveis da base do prefeito, a proposta abre caminho para a privatização disfarçada de um dos principais patrimônios públicos da capital gaúcha. O texto permite entregar à iniciativa privada atividades como a distribuição de água, a coleta e o tratamento de esgoto, além da drenagem urbana, deixando sob controle público apenas a captação e o tratamento inicial da água.

A votação foi conduzida em ritmo acelerado, durante a madrugada, para reduzir a mobilização popular e a repercussão na imprensa. Vereadores e vereadoras de oposição denunciaram a falta de diálogo e de transparência na tramitação do projeto.

Privatização já deu errado em várias partes do mundo

A experiência internacional mostra que entregar o saneamento ao setor privado nunca trouxe os resultados prometidos.

Na França, por exemplo, a cidade de Paris reestatizou o serviço de água em 2010, após décadas de concessão a empresas privadas. A “remunicipalização” reduziu as tarifas em cerca de 8% e ampliou o investimento público. O modelo se tornou referência mundial.

Entre 2000 e 2019, segundo estudo da Transnational Institute, mais de 300 cidades em 36 países realizaram processos semelhantes de retorno ao controle público, justamente por constatarem aumentos abusivos de tarifas, queda na qualidade do serviço e falta de transparência nos contratos.

Mesmo em países desenvolvidos, como Alemanha, Itália e Reino Unido, os governos locais vêm revertendo concessões por entenderem que o lucro privado é incompatível com a gestão democrática da água.

O que está em jogo em Porto Alegre

O DMAE é reconhecido historicamente pela sua capacidade técnica e qualidade dos serviços, sendo referência nacional e internacional em saneamento básico. A autarquia é autossustentável financeiramente, mas vem sendo enfraquecida por políticas de desinvestimento e falta de reposição de servidores, cenário esse que agora é usado como justificativa para a concessão.

Fernando Antunes/CMPA

Além disso, a atual gestão já havia promovido mudanças na estrutura do órgão, como a extinção do Conselho Deliberativo do DMAE, que garantia participação popular e transparência nas decisões. Essa medida foi criticada por servidores e entidades como uma etapa preparatória para a privatização.

“Água não é mercadoria”

A CUT-RS reforça que o acesso à água e ao saneamento é um direito humano reconhecido pela ONU e não pode ser tratado como mercadoria.

A Central defende que o município invista na gestão pública eficiente, com controle social, valorização dos trabalhadores e planejamento de longo prazo, garantindo a universalização do acesso sem entregar o patrimônio da cidade.