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Jovens lideram pedidos de demissão no RS em busca de mais qualidade de vida

Quase metade das demissões entre trabalhadores com até 29 anos no Rio Grande do Sul foram voluntárias; movimento expõe novas prioridades e reforça urgência de reduzir a jornada de trabalho no Brasil

Publicado: 12 Maio, 2025 - 11h10 | Última modificação: 12 Maio, 2025 - 11h43

Escrito por: Zero Hora | Editado por: CUT-RS

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Com cada vez mais jovens dizendo “não” a jornadas exaustivas e relações de trabalho desgastantes, cresce no Rio Grande do Sul o número de pedidos de demissão voluntária entre trabalhadores de até 29 anos. No acumulado de 12 meses encerrados em fevereiro, foram mais de 315 mil desligamentos voluntários, o que representa 45,2% do total de demissões neste grupo etário, o maior índice em cinco anos. Os dados fazem parte de um levantamento do jornal Zero Hora, com base em microdados do Novo Caged, do Ministério do Trabalho e Emprego, e metodologia da LCA 4intelligence.

Esse fenômeno, impulsionado pela busca por mais equilíbrio entre vida pessoal e profissional, está diretamente ligado ao que a CUT-RS vem denunciando com a campanha “A vida não tem hora extra”: o modelo de trabalho atual, baseado em jornadas longas, instabilidade e adoecimento, não serve mais para os trabalhadores.

A juventude está puxando essa transformação. É o caso de Keila Machado, de 19 anos, que recusou uma vaga de 12 horas por dia, das 7h às 19h, com duas horas de deslocamento, após terminar o curso de Jovem Aprendiz. "Eu teria que acordar às 3h da manhã. Para mim, não batia. Tive que recusar", relata. Keila buscou novas oportunidades que respeitassem seu tempo e estivessem mais alinhadas com seus sonhos — como a de recepcionista em uma clínica de psicologia, área onde pretende construir carreira.

Demissões voluntárias sobem entre jovens de 18 a 24 anos

Entre os mais jovens, de 18 a 24 anos, o percentual de demissões voluntárias é ainda maior: 46,3%, bem acima da média geral de 41,5%. Os dados revelam um comportamento que vem se consolidando: a juventude quer menos tempo gasto com o trabalho e mais qualidade de vida, educação e desenvolvimento pessoal.

Eduarda Andrade, 26 anos, também trocou um trabalho com melhor salário por outro com jornada menor. “Tive que escolher entre ganhar mais e não ter saúde, ou ganhar menos e conseguir estudar, pensar no futuro.” Já Manoela Costa, professora de inglês, decidiu deixar a rotina estressante das escolas e passou a dar aulas online de forma autônoma. “Quero ser valorizada, mas não quero me sobrecarregar”, resume.

Uma geração que questiona a lógica da exaustão

Segundo especialistas, os jovens estão mais preparados para lidar com um mercado digitalizado, menos apegados à “estabilidade” tradicional e mais preocupados com o sentido e o impacto do trabalho em suas vidas e na sociedade.

“A geração anterior aceitava passivamente. A mais nova questiona, valoriza a qualidade de vida e não aceita mais ser engolida pela lógica do trabalho excessivo”, explica Judith Ferran, coordenadora do curso de Administração da PUCRS.

Empresas atrasadas, juventude em movimento

A vice-presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos no RS, Isabel Degrazia, alerta: as empresas ainda não estão preparadas para lidar com uma juventude que exige flexibilidade, propósito e respeito ao tempo pessoal. "Ou elas se adaptam, ou continuarão perdendo talentos."

O economista Bruno Imaizumi complementa: "A operação das empresas é afetada porque há custo alto na rotatividade. Se quiserem evitar isso, precisam oferecer melhores condições de trabalho."

Reduzir a jornada já

A CUT-RS defende que essa mudança de comportamento é um alerta de que o modelo atual chegou ao limite. Reduzir a jornada de trabalho sem redução de salário é uma forma concreta de responder à crise atual, que é de saúde, tempo e que afeta especialmente a juventude.

“A vida não tem hora extra” é mais do que um slogan, é a síntese de um desejo coletivo que pulsa nas decisões de milhares de jovens trabalhadores que dizem, na prática, que não querem viver só para trabalhar. Querem tempo para estudar, cuidar da saúde, conviver, sonhar. Querem viver.”